Bleeding Heart Hayek e Rawls

Publicado em 17 de fevereiro de 2014 | por Felix Bungay

John Rawls: Pelos vouchers, contra o salário mínimo

Quando se olha para o pensamento político liberal contemporâneo, filósofos como Samuel Freeman e John Tomasi gostam de destacar a diferença entre liberais clássicos, como Hayek e Friedman, e liberais igualitários (ou liberas de esquerda), como Rawls e Nagel.

Acontece que eu penso que há uma base em comum maior entre os dois grupos do que geralmente se percebe. Vamos dizer, se engajando em um “experimento de pensamento”, que nós fechemos Rawls, Freeman, Freedman e Hayek em um quarto e exigimos que eles venham a ter as mesmas posições sobre política pública. Nós daremos a eles água e comida, mas não os deixaremos sair do quarto até que eles todos concordem, de forma unânime, sobre uma posição. Que políticas (se houvesse alguma) poderiam surgir – ou eles todos apenas ficariam emperrados no quarto, argumentando pela eternidade?

E se eu dissesse que eles concordariam em descartar o salário mínimo, em ter um sistema completamente privado de escolas, baseado em vouchers, e mesmo em descartar muito dos programas de assistência governamental, realocando-os em um simples imposto de renda negativo, você acreditaria em mim?

Quando discutia sobre justa igualdade de oportunidade em “Uma Teoria da Justiça”, Rawls disse que “o governo tenta assegurar iguais chances de educação e cultura para pessoas similarmente dotadas e motivadas seja por subsidiar escolas privadas ou por estabelecer um sistema público de escolas”. De modo muito significativo, o próprio Rawls não pensava que o governo precisava prover educação ou necessariamente estabelecer um sistema de escolas públicas para satisfazer as exigências da igual oportunidade, de modo que um sistema inteiramente privado de escolas não seria incogitável. Como Samuel Freeman disse, os “escritos [de Rawls] implicam que um sistema de educação inteiramente privado, mas publicamente financiado e regulado (por exemplo, um sistema de vouchers) seria compatível com FEO (fair equality of opportunity – princípio da justa igualdade de oportunidades)”. Milton Friedman poderia pular de alegria.

E o que dizer do salário mínimo? Bem, em uma entrevista ao canal PBS, Samuel Freeman disse que Ralws opunha-se ao salário mínimo (apesar disso, a revista The Economist nos diz que o plano de Obama para aumentar o salário mínimo faz dele um Rawlsiano – o que é uma erudição rasa): “Ele (Rawls) pensava que nós deveríamos nos livrar do salário mínimo e deixar que os empregadores pagassem apenas dois, três dólares por uma hora se eles pudessem, e aí o governo viria e complementaria isso.”

E qual forma Rawls acreditava que esse complemento deveria tomar? Bem, novamente baseou-se em Milton Friedman e argumentou por um imposto de renda negativo. Quando estava discutindo as instituições associadas com o seu segundo princípio de justiça (capítulo 5 de “Uma Teoria da Justiça”), Rawls disse que “o governo deve garantir um mínimo social, seja por subsídios familiares e pagamentos especiais por doença e desemprego, ou mais sistematicamente por meio de mecanismos tais como um complemento de renda graduado (o assim chamado “imposto de renda negativo”)”.

Dessa forma, mesmo que Rawls, Freeman, Friedman e Hayek não fossem melhores amigos, talvez haja bem mais base para que posições associadas com a “direita de livre mercado” sejam encontradas no trabalho de Rawls do que liberais clássicos ou de esquerda geralmente discutem. Rawls, o entusiasta da desregulatória escolha de escola, é um conto bastante diferente do que aquele que você normalmente ouve.

// Tradução de Valdenor Júnior. Revisão de Adriel Santana. | Artigo Original


Sobre o autor

Felix Bungay

Felix Bungay estuda em na Universidade de Cambridge e está escrevendo sua dissertação de mestrado sobre História Intelectual e o Pensamento Político.



Voltar ao Topo ↑