Anarquia, Estado e pirataria
Nenhuma pessoa em sã consciência acredita que a anarquia gera ordem. A idéia de que a anarquia possa ser superior ao governo em alguns casos parece ainda mais absurda.
Todos, de Thomas Hobbes a Adam Smith, repetem a alegação de que as sociedades precisam do governo para a proteção da propriedade e para a difusão da cooperação. Mesmo os pensadores mais liberais crêem que isso seja verdade. Como apontou Milton Friedman, “o governo é essencial como fórum para se determinar as ‘regras do jogo’ e também como árbitro para interpretar e aplicar as regras que forem escolhidas.”
O autogoverno, entretanto, pode funcionar melhor do que você pensa. Um pequeno grupo que se denomina “anarco-capitalistas” renega a idéia de que a anarquia seja o caos. No século XX, o mais destacado desses pensadores foi Murray Rothbard, que baseou sua defesa da anarquia na teoria dos direitos naturais, e David Friedman, cujo livro, As Engrenagens da Liberdade (The Machinery of Freedom - livro / vídeo), forneceu uma defesa essencial e conseqüencialista de uma sociedade exclusivamente privada.
Apesar dos argumentos teóricos importantes presentes nesse e em outros trabalhos anarco-capitalistas – mesmo entre aqueles já familiarizados com o tema – a maioria das pessoas ainda não está convencida. De um lado, as defesas dos direitos naturais da anarquia não convencem conseqüencialistas, como os economistas, que vêem problemas significativos na capacidade da anarquia de lidar com a fraude e a violência.
Por outro lado, a maioria das defesas conseqüencialistas da anarquia são puramente especulativas. Ao pensar respostas para como uma sociedade poderia lidar sem o Estado com todas as contingências que possivelmente pudesse se confrontar, os anarquistas freqüentemente oferecem suposições imaginativas que, em alguns casos, beiram a ficção científica.
Ironicamente, a defesa da anarquia extrai suas forças de evidências empíricas e não da teoria.
A maior parte do mundo, na maior parte de sua história, existiu sem que houvesse governos em vigor. Conforme aponta o historiador econômico Joel Mokyr, “na Inglaterra”, por exemplo, “não existia sequer uma força policial profissional para proteger a propriedade privada até o século XIX.
Extensas arenas da atividade econômica mundial permanecem anárquicas, ou quase anárquicas, até hoje. Por exemplo, não existe nenhuma soberania supranacional com a autoridade de criar leis internacionais formais para regular os países ou para fazer com que, caso existissem, essas leis fossem cumpridas. Somada à anarquia internacional está a ausência de uma lei comercial, estatal, supranacional, para forçar o cumprimento de contratos entre comerciantes internacionais privados.
Em grandes áreas do mundo em desenvolvimento, os governos são fracos demais ou mesmo incapazes de executar até as funções mais básicas, como assegurar os direitos de propriedade de seus cidadãos. De acordo com o Failed States Index de 2007, os governos em 129 países entraram ou estão à beira de entrar em colapso. A Somália já não tem governo central algum.
Mesmo nos bolsos do mundo desenvolvido a anarquia persiste. O custo da coerção estatal, unido ao fato de que o olho do Estado não pode estar em todos os lugares o tempo todo, significa que as pessoas não podem, em muitos casos, confiar no governo para a proteção de sua propriedade ou para assegurarem seus contratos, embora, oficialmente, exista um Estado funcionando perfeitamente.
Apesar dessas significativas arenas de anarquia, nós não observamos uma guerra mundial perpétua na ausência de um governo global, nem o encolhimento do comércio internacional na ausência de uma lei comercial supranacional ou mesmo a deterioração dos padrões de vida na Somália. Pelo contrário, a paz prevalece predominantemente entre os países do mundo, o comércio internacional prospera e o desenvolvimento aumentou na Somália durante a falta de Estado.
Se o senso comum está certo, então a realidade deve estar errada. Mas como isso pode acontecer?
As evidências empíricas passadas e presentes mostram um pouco como os indivíduos sob a anarquia desenvolvem soluções institucionais privadas para comunicarem os problemas que a ausência de Estado apresenta. A força por trás dessas soluções não é nada além da “mão invisível” de Adam Smith. Significativamente, os princípios de Smith se aplicam não apenas às atividades individuais no contexto de instituições funcionais, mas também às suas atividades no desenvolvimento das próprias instituições.
O gancho invisível
Um dos exemplos mais interessantes desse fenômeno vem dos piratas dos séculos XVII e XVIII. Em vários sentidos, os navios piratas se pareciam com sociedades flutuantes. E, como em outras sociedades, os navios piratas enfrentavam problemas como a fraude e o roubo. Por serem criminosos, os piratas não gozavam da proteção do Estado. O governo não regulava os acordos empregatícios entre piratas, bem como seus outros contratos, além de também não evitar ou punir o roubo entre os piratas.
Claramente, o ambiente anárquico no qual os bandidos marítimos operavam não os levou a simplesmente levantarem suas mãos e abandonarem seus empreendimentos criminosos. Pelo contrário, o prospecto de ganhos mútuos a partir da organização desse empreendimento fornecia incentivos para os piratas buscarem, através de meios privados, garantir a cooperação e a ordem.
Mesmo para os padrões modernos, as instituições piratas desenvolvidas com esse propósito eram absolutamente sofisticadas. Os piratas criaram uma das primeiras formas de constituição escrita, chamada por eles de “artigos”, que codificavam muitas das regras que regiam seus navios, bem como as punições para os transgressores das leis. Ali estavam incluídas também regras que especificavam a divisão do saque, além de “leis” contra o roubo e mesmo um seguro de proteção para os trabalhadores, para prestar auxílio aos membros da tripulação feridos em batalhas.
Para a aplicação das punições e para a resolução de disputas entre membros das tripulações, os piratas criaram um cargo, o “intendente”. Os membros das tripulações controlavam os intendentes através dos artigos – que recomendavam as “leis” que os intendentes poderiam aplicar – e através de eleições democráticas que elegiam membros das tripulações para esse cargo.
O cargo de intendente permitiu aos piratas ultrapassar outro obstáculo que a anarquia oferecia à sua organização – a contenção dos capitães piratas potencialmente violentos. Um capitão possuidor de uma autoridade ilimitada seria capaz de roubar sua equipe, confiscar o produto dos saques, maltratar sua tripulação, etc. Para controlar esses abusos, os piratas iniciaram um dos sistemas pioneiros na divisão do poder, que transferiu as autoridades potencialmente abusivas do capitão para o intendente. Junto com a eleição democrática de seus capitães, os controles piratas superaram a ameaça de serem explorados pelo capitão.
Esse sistema de governo era totalmente voluntário. Os piratas redigiam os artigos que governavam seus navios antes da viagem e requisitavam o consentimento unânime antes de navegarem. Qualquer futuro tripulante que discordasse das regras propostas era livre para deixar o barco antes que a navegação se iniciasse.
O sistema de governo privado dos piratas funcionou extremamente bem. O conflito entre os piratas era raro, a manutenção da ordem era bem feita e os piratas cooperavam regularmente, colocando-se entre as organizações criminosas mais eficientes da história.
Negociando com bandidos
Uma objeção comum à anarquia é que, sem o governo, os mais fortes roubariam os mais fracos. Certamente, o argumento mais aceito, e talvez o mais antigo, em favor do Estado diz respeito à impossibilidade de os mais fracos evitarem que os mais fortes os roubem. E como o autogoverno poderia evitar isso?
Vários mecanismos da autogovernança dependem da reputação para assegurarem a boa conduta. Não é difícil de ver como a reputação em muitos casos evita a fraude mesmo onde a coerção governamental não é uma opção.
Imagine que você vá a um restaurante e peça um filé mignon que custa 30 reais. Quando sua comida chega, você percebe que o restaurante lhe serviu uma costela de 10 reais. O restaurante lhe enganou. Você pode processar o dono; mas então você percebe que o tempo que isso lhe custaria faz com que o caso não valha à pena, mesmo que você vencesse. Embora, em princípio, o governo exista para julgar essa questão, na prática não é o que acontece.
A sua experiência durante o jantar é uma pequena parcela de anarquia. Sabendo disso, os proprietários do restaurante deveriam, para sempre, servir costelas de 10 reais para os consumidores que pedissem filé mignon. É óbvio que os restaurantes não fazem isso. E não o fazem porque sabem que, se o fizerem, você parará de comer lá e pedirá a todos os seus conhecidos que também boicotem o restaurante. Mesmo sem o governo, a “mão invisível” de Smith leva o restaurante a fazer a coisa certa.
Entretanto, os mecanismos de autogoverno baseados na reputação têm um problema maior. Eles requerem que o dono do restaurante não possua o poder de lhe tomar dinheiro contra a sua vontade. Se, por exemplo, você anuncia o seu boicote ao restaurante enganador, mas o dono é mais forte que você o suficiente e pode usar ameaças de violência para conseguir “clientes futuros”, a sua ameaça de boicote perde o sentido. A reputação perde o sentido.
À luz desse problema, muitos observadores concluíram que a anarquia é incapaz de lidar com o problema da força. Felizmente, indivíduos sob condições reais de anarquia, que realmente enfrentaram esses problemas, são mais criativos que esses observadores.
Um caso histórico simples do fim do período colonial em Angola ilustra isso muito bem. No fim do século XIX, a costa de Angola sediava um próspero mercado exportador, que enviava produtos africanos para a Europa. De um lado desse mercado estavam os colonos europeus que operavam a indústria exportadora e do outro lado estavam produtores africanos, no interior do país, que cultivavam os produtos que seriam exportados. Ligando esses dois grupos, estavam os intermediários africanos, que viajavam até o interior para coletar os produtos e levá-los ao litoral, para serem exportados.
No século XIX, essa região era, para todos os efeitos, anárquica. Embora os europeus possuíssem colônias com leis européias e as comunidades africanas no interior tivessem suas próprias instituições de governo interno, amplamente informais, não havia nenhum governo para supervisionar as interações entre os membros desses grupos com os intermediários. O problema disso tudo foi que o intermediário tendia a ser substancialmente mais forte do que os produtores do interior, havendo sempre a ameaça do uso da força. Por que os intermediários pagariam aos produtores, se com sua força poderiam simplesmente roubá-los?
Conforme acontecia com os piratas, ao invés de jogarem a toalha e aceitarem que seriam sempre roubados ou então pararem todas as atividades produtivas para que não houvesse mais nada que os intermediários pudessem roubar, os produtores africanos inventaram uma solução institucional para o problema da força, o que lhes permitiu concretizar os benefícios do comércio com esses bandidos.
A instituição que criaram para esse propósito foi o crédito. A chave para se entender como o crédito solucionou o problema da força e facilitou o comércio pacífico é bem simples: você não pode roubar produtos que ainda não foram produzidos, mas você pode negociá-los.
Eis a forma como o crédito funcionava: os produtores não produziriam nada hoje. Ao invés disso, esperariam o intermediário chegar à suas comunidades procurando por produtos para roubar. Não havendo nada disponível para o roubo, o intermediário tinha apenas duas opções: retornar ao litoral de mãos vazias, depois de ter feito uma viagem para o interior, ou fazer um acordo com os produtores para que fornecessem os produtos que precisavam à base de crédito. Diante dos custos de sua viagem ao interior, os intermediários geralmente escolhiam a última opção.
De acordo com seus acordos de crédito, os intermediários pagavam antecipadamente aos produtores e concordavam em retornar mais tarde para buscar os produtos. Quando retornavam, tudo que havia disponível era seus próprios produtos, pelos quais já tinham pagado. Assim, o roubo já não era uma opção. Ao invés disso, os intermediários freqüentemente renovavam o acordo de crédito, o que iniciou um ciclo de comércio baseado no crédito.
Esse arranjo simples desempenhou dois papéis importantes ao permitir que os produtores vencessem a ameaça da força representada pelos intermediários. Em primeiro lugar, possibilitou que eles evitassem ser roubados, já que não tinham produzido absolutamente nada, mas também que capitalizassem os ganhos do comércio, já que os intermediários não eram mais uma ameaça de violência. Em segundo lugar, isso transformou os produtores, aos olhos dos intermediários, de alvos de ações de banditismo em produtos de valor que eles tinham interesse em proteger. Se os intermediários desejassem ser reembolsados, eles precisavam assegurar que seus devedores permaneceriam vivos e bem o suficiente para produzir. Isso significava abrir mão da violência contra os produtores e protegê-los contra a violência de outros.
Melhor sem o Estado?
“Tudo bem”, você pode pensar. “Então, historicamente, existem alguns casos onde a anarquia pareceria funcionar muito bem. Mas isso não demonstra que a anarquia tenha sido alguma vez superior ao governo.” É verdade, mas fatos recentes na Somália são uma demonstração dessa possibilidade.
De 1960, quando a Somália se tornou independente, até 1991, o país foi governado por um ditador socialista (embora, oficialmente, ele tenha abandonado o socialismo) chamado Mohamed Siad Barre. As políticas e o comportamento de Barre pareciam com as políticas e o comportamento destruidor de riquezas, absurdamente corrupto e enormemente predatório que observamos em muitos outros países subsaarianos atualmente.
Em 1991, um golpe de estado derrubou o regime de Barre. Mas, diferentemente de outros golpes que substituem um regime predatório por outro, esse substituiu o antigo regime por nada. Embora tenha havido algumas tentativas fracassadas de ressuscitar o governo na Somália, inclusive uma mais recente feita pelo “Governo Federal de Transição” com o apoio da comunidade internacional, a Somália tem vivido sem governo há mais de quinze anos.
Essa situação foi fonte de muitas preocupações entre os observadores internacionais que, continuamente, apontavam para a extrema pobreza e para os outros problemas do país. Dessa forma, a Somália se transformou em um símbolo da indispensabilidade do governo e da evidência de que a anarquia leva a um declínio caótico.
A grande ironia dessas afirmações é que os dados que temos a respeito da anárquica Somália apontam exatamente na direção oposta: ou seja, a anarquia na Somália produziu um nível maior de bem-estar do que o governo foi capaz.
Em um estudo recente, eu comparei o bem-estar sob a anarquia com o bem-estar sob o governo, utilizando todos os principais indicadores de desenvolvimento que os dados me permitiam comparar. De acordo com os dados, dos dezoito indicadores de desenvolvimento, quatorze deles mostram melhoras inequívocas sob a anarquia. A expectativa de vida é mais alta hoje do que era nos últimos anos de existência do governo; a mortalidade infantil caiu 24%; a mortalidade materna caiu mais de 30%; a incidência de bebês que nascem abaixo do peso caiu mais de 15%; o acesso aos serviços de saúde aumentou mais de 25%; o acesso ao saneamento aumentou 8%; a pobreza extrema caiu mais de 20%; o número de crianças de até um ano de idade imunizadas contra a tuberculose aumentou quase 20%, e contra o sarampo aumentou 10%; as mortes por sarampo caíram 30% e a presença de televisores, rádios e telefones cresceu de 3 a 25 vezes.
Como Tatiana Nenova e Tim Harford discutem em seu relatório do Banco Mundial chamado “Anarchy and Invention” [Anarquia e invenção], boa parte desse desenvolvimento pode ser atribuído às melhoras nos bens públicos melhor fornecidos pelo anárquico setor privado da Somália do que por seu antigo governo.
Será que a partir das melhoras obtidas sem o Estado, a Somália passou a ser um bom lugar para se viver? Claro que não. Porém, o desempenho da Somália nos períodos pré e pós-governo destaca um ponto importante sobre a conveniência da anarquia. Contrariando o pensamento convencional, não é verdadeiro que qualquer governo seja superior a nenhum governo. Se a predação do Estado ocorre sem limitações, o governo poderá não apenas fracassar em sua contribuição para o bem-estar social, mas poderá, na verdade, reduzir o bem-estar abaixo de seu possível nível em uma situação anárquica. Era esse o caso na Somália, onde o Estado trouxe mais danos que benefícios aos seus cidadãos.
A Somália é extremamente pobre e continua a ser um país com problemas inacreditáveis. Mas isso não demonstra as vantagens de se ter um governo ou as desvantagens da anarquia – como muitos dos que defendem a reintrodução do governo na Somália alegam.
Quando pensamos sobre o mundo desenvolvido nós devemos ter o cuidado de evitar cometermos o que o economista Harold Demsetz chamou de “falácia do nirvana”. A “falácia do nirvana” ocorre quando ignoramos as restrições do mundo real que limitam nosso leque de opções (e assim os resultados) que temos disponíveis. Por exemplo, em um mundo onde sou tão rico quanto Bill Gates, posso dirigir uma Ferrari. Entretanto, limitado por minha renda atual, só consigo dirigir um Subaru. Embora eu, por motivos óbvios, prefira a Ferrari, seria idiota concluirmos que eu deva dirigir uma Ferrari apenas por ser um carro melhor. O fato de que a Ferrari é superior é irrelevante; dadas as limitações que estão à minha frente, a Ferrari não está em meu conjunto de escolhas possíveis.
Nós podemos estender esse exemplo mais além. Imagine que eu acredite – de maneira incorreta – que eu deveria estar mesmo dirigindo uma Ferrari, e que então resolva tentar. Os limites do meu orçamento não me permitem comprar uma Ferrari que funcione. Mas posso comprar uma Ferrari com problemas no motor tão graves que ela poderia até explodir, caso eu tente dirigi-la. Então, um Subaru e uma Ferrari quebrada estão dentro do meu conjunto de escolhas. Se eu comprar a Ferrari quebrada, será que vou estar melhor do que com o Subaru? É claro que não. Em face das escolhas verdadeiramente permitidas por minhas limitações, eu estaria em uma situação melhor com meu Subaru.
O mesmo tipo de raciocínio se aplica à comparação da anarquia versus o governo na Somália e à grande parte do mundo em desenvolvimento que balança com o colapso do Estado. Embora seja certamente racional acreditar que um governo transparente, limitado e funcional, como o que temos nos Estados Unidos, melhoraria o bem-estar da Somália além do que o país experimenta hoje sob a anarquia, isso não significa que a reintrodução do governo na Somália seria melhor para seus cidadãos.
Como todas as outras escolhas, as escolhas que enfrentamos ao “selecionarmos” governos são restritas. Infelizmente para a maioria dos países em desenvolvimento, o conjunto de escolhas políticas que enfrentam é bem menor do que o conjunto de escolhas políticas que os países desenvolvidos têm disponíveis. As características históricas, como a tensão entre os clãs, a corrupção desenfreada, os conflitos territoriais e muitos outros, que não podem ser modificados em curto prazo, restringem muito o tipo de governo que países como a Somália podem esperar racionalmente ter caso tenham algum governo.
Infelizmente, governos com bom funcionamento e limitados – como os que vemos nos Estados Unidos e na Europa Ocidental – não são parte de seu conjunto de escolhas. Entretanto, governos predatórios, corruptos e abusivos são. A anarquia também. E como a experiência da Somália exemplifica, para vários países entre os menos desenvolvidos, com as mesmas limitadas opções, a anarquia pode muito bem ser a melhor das opções possíveis.
Observações finais
A anarquia, como todas as organizações político-econômicas, é cheia de problemas. Entretanto, não está claro que esses problemas são mais numerosos ou mais sérios do que aqueles que atormentam os governos. Eu argumentei que a anarquia funciona melhor do que você pensa. Diante de obstáculos que interferem na capacidade dos indivíduos de cooperarem para o ganho mútuo, os indivíduos desenvolvem soluções para superar esses obstáculos. Isso é verdadeiro em sociedades dirigidas por governos, como sociedades que existem sem governo. Onde o Estado não provém lei, ordem ou as instituições requeridas para a produção dessas coisas, instituições privadas surgem para desempenhar esses papéis.
Os meus exemplos acima não têm a intenção de sugerir que essas soluções institucionais em particular são generalizáveis ou de alguma forma sugerem como outras sociedades sem governo se desenvolveriam. Por outro lado, não existe um modelo de como a anarquia funciona ou funcionaria. Isso, de fato, é a questão. As respostas institucionais privadas refletem problemas, tempos e lugares específicos, além de outras condições que os causam. Em um tempo diferente, em um lugar diferente, com pessoas diferentes, mesmo uma situação problemática idêntica poderá ser enfrentada de uma forma diferente sob a anarquia.
A característica unificadora dos meus exemplos é o incentivo que os indivíduos têm para solucionar seus problemas. Nesse sentido, a evidência empírica da anarquia demonstra apenas que enquanto existir ganhos a serem concretizados, as pessoas continuarão a encontrar formas de concretizá-los. Felizmente, para os anarquistas, esse “apenas” é muito importante.